Ontem fui convidada para celebrar o Dia Internacional da Mulher numa das maiores fábricas portuguesas, a Visteon, num plenário geral de trabalhadores, centenas, onde a maioria são mulheres. Foi emocionante, mas triste, muito triste. Trabalham 8 horas em pé, junto a uma máquina, desde que a empresa foi automatizada (antes trabalhavam sentadas), ouvi relatos do século XIX, vi faces exaustas, penosas: «Não sinto as pernas, professora», «Chego ao meio dia e não sinto nada da cintura para baixo», «Sinto-me a desfalecer…». Já há na fábrica vários relatos, e alguns já diagnosticados, de uma doença na planta do pé/tendão. Confirmei tudo o que pensava sobre esta «onda» de feminismo a que a esquerda aderiu acriticamente e que na minha opinião é um desastre e um retrocesso para a igualdade, a menos que consideremos igualdade a igualdade conseguida pela nivelação por baixo, na pobreza de vida e no trabalho penoso. Sobre o tema deixo um curto excerto de uma longa entrevista que dei sobre, tem 20 páginas, vai ser publicada por uma revista académica, este é só um excerto a propósito da nova onda de feminismo cujo programa baseia-se na competição (e muitas vezes ódio) aos homens, em vez de um programa comum de melhoria de condições de trabalho e vida para ambos.
“Há riscos, claro, hoje nesta onda de feminismo ser dominada pelos desejos do Banco Mundial (BM) de incorporar força de trabalho feminina criando competição com os homens – justamente aquilo que estava mal antes vem agora reforçado na onda de feminismo. Um estudo publicado pelo BM calcula em 130 biliões de euros as perdas de “capital humano por as mulheres não estarem plenamente incorporadas ao mercado de trabalho assalariado em muitos países” (UNREALIZED POTENTIAL: THE HIGH COST OF GENDER INEQUALITY IN EARNINGS QUENTIN WODON AND BENEDICTE DE LA BRIERE MAY 2018).
Cuidado com o que desejas, já diziam todos os contos infantis. Pode tornar-se realidade. Com a automação e mecanização, as mulheres podem fazer os trabalhos de homens, estar numa linha de montagem da indústria automóvel 8 horas seguidas, com uma pausa de 7 minutos. Ele ajuda com as crianças e ela vai para a linha de montagem, intensificação à escala global da exploração. Na ordem da acumulação de capital, as empresas querem lucro e o gênero desaparece para seremos todos trabalhadores plenamente alienados, inclusive alienados do corpo e do sexo. No mundo do capital, somos todos nem homens nem mulheres, mercadorias sem sexo ou gênero. O que é um absurdo, há diferenças entre nós que têm que ser respeitadas, igualdade é respeito pela diferença.
Agradeço que um homem me carregue a mala quando a tiro da cabine do avião, fico até ofendida quando não o fazem (e hoje quase nenhum homem o faz), porque ele tem mais força muscular; eu carregava no meu osso da anca os meus filhos gêmeos um de cada lado, com uma facilidade que quase nenhum homem consegue, apesar de eu ter duas hérnias discais, aquele osso é parte da anatomia da maioria das mulheres.».